Love, Drugs n' Rock & Roll - Capítulo XI

[Ava Prescott] 

Tinha a mais perfeita noção do que estava a ver, mas, mesmo assim duvidava de que não fosse apenas mais uma partida da minha mente imaginativa na sua hora de ponta. Desejava tanto que aquilo que presenciava não fosse um sonho. Penso que nesse momento a cor da minha pele passou de branco a vermelho, corei tanto que sentia a minha face a efervescer. Que estupidez desejar ver o meu professor a cantar, ele não passava de uma pessoa normal que como todas as outras encontrou uma maneira de se refugiar do quotidiano.
 Senti os olhos de alguém a revistar-me como se fosse um doente num TAC. Em seguida o rapaz que estava ao balcão começou a dirigir-se para a minha mesa e fez-me sentir desconfortável com o seu olhar tão familiar, embora não fizesse a menor ideia de onde o conhecia.
 - Boa noite! Deseja tomar alguma coisa? - desta vez senti-me tão criança quanto já fui. Aquele sorriso que o rapaz transmitia era conhecido demais para não me lembrar de onde ele era. Não consegui evitar sorrir para ele também.
 - Boa noite! Sim, pode ser uma Coca-Cola, por favor!
 - Claro! Já a trago. - e mais uma vez sorriu e a sua cara tornou-se um poço de simpatia.
Quando estava mesmo para lhe perguntar se nos conhecíamos de algum lado, ele virou costas e foi anotar os pedidos das outras mesas.
A banda estava de novo toda em cima do palco e agora estavam a preparar-se para cantar uma música um pouco mais pesada que, mesmo já a tendo ouvido várias vezes não sabia o nome dela.
O baterista começou a tocar e como se a banda fosse um corpo, um complexo e intrincado organismo, o coração começou a bombear o sangue e uma nova vida nasceu. O baixo começou a marcar o ritmo e o corpo começou a crescer, a guitarra ressoou e este individuo ganhou forma. E por fim a alma emergiu e o que tinha sido antes apenas um corpo, era agora uma pessoa com alma. A voz de "Andy" suou diferente, mais profunda e profissional, parecida com a de Corey Taylor, podia dizer-se que estava perto de delirar, saltar da cadeira e pôr-me aos saltos e a gritar, mas o meu senso alertou-me para a realidade.
O meu mais recente amigo, professor e cantor, deve ter reparado como estava feliz, sorriu para mim e piscou-me o olho claro eu retribui o sorriso. Envergonhada desviei o olhar para o banco ao meu lado e nesse parecido momento dei um salto que entraria para o Guinness se alguém o registasse.
Passados tantos anos lá estava ela, igual ao que sempre fora, com as mesmas cores e com os mesmos cheiros, com a mesma expressão e com a mesma presença. Como sempre aparecera sem ninguém reparar nela e estava a observar-me, com a sua timidez e a sua beleza, não consegui sorrir-lhe ou abraça-la, apenas fiquei a observa-la e ela a mim, nada nesse momento era desconcertante ou disparatado era um reencontro de duas almas que para sempre ligadas.
- Ava! Tanto tempo. - nem a voz mudara, era a de sempre, aquela única voz que eu sabia que ouvia mais do que se exprimia, aquela que era a única que parecia sair em fumo e me acariciava acalmando-me. Desta vez sorri. E derramei, sinceramente não sei como, apenas uma única lágrima, que ela como tantas outras guardou.
- Emily! Emily! Emily! Que bom! - abracei-a e ela a mim, desta vez não me admirei. A pele dela. Nada mudou. - Como me encontras-te?
- Foi o meu irmão que me avisou que estavas aqui. Sabes, ele trabalha neste bar. - claro, faz todo o sentido, aquele rapaz era o Nigel.
- Bem me parecia que ele era demasiado familiar. Ele mudou tanto! Tu estás igual!
- Ele não mudou assim tanto, repara bem. - eu fiz o que ela me mandou, e lá estava ele com aquele cabelo ruivo desgrenhado cortado á pressa, aqueles olhos cinzentos que poucos tinham o direito de os conhecer, com as sardas e o seu geito atabalhoado e amável. Era o mesmo Nigel, o mesmo Lucky de sempre.
- Tens razão, não acredito como não percebi que era ele. Que idiota! E tu? Vens aqui muitas vezes? Fogo, a sério não imaginas o quão feliz me fizesses-te ao vir ter comigo.
- Venho com o meu irmão ás vezes. Não sabia que também frequentavas isto. É boa esta banda, não é? Costuma tocar aqui.
- Sim, o vocalista é meu professor de História da Cultura e das Artes, ele é muito simpático.
- Pois eu reparei que gostas muito dele. - o tão conhecido, sorriso matreiro dela, rasgou-lhe a cara, nesse momento ela parecia uma raposa com as orelhas aguçadas e com olhar esperto. Passou de sorriso a gargalhada que acabei por me juntar a ela. Era inevitável tentar debater-me contra as suas acusações. Emily, mesmo sem ter argumentos de defesa ou ataque ganhava sempre qualquer discussão. Era incrível essa sua capacidade, mas também bastante irritante, confesso.
Nigel veio ter connosco e sentou-se na nossa mesa e como se fosse algo incontrolável levantei-me e abracei-o tentando em vão recuperar os anos de distância. Ele retribuiu o abraço e como antes, devido ao seu sorriso voltei a sentir-me criança novamente.
Sentámo-nos e o Nigel levantou-se e sem referir uma única palavra, seguiu rumo á cozinha.
- O que é que ele vai fazer? Será que ele ficou irritado comigo, por o ter abraçado?
- Claro que não, não sejas totó! Tu já vais ver o que ele traz. Eheh.
O meu olhar passou outra vez pelo palco, onde agora estavam a acabar de tocar outra música. Andy estava nesse momento a olhar para a guitarrista e ela estava a sorrir para ele. Assim conseguia ser mais amorosa do que antes fora, quando a conheci.
Nigel voltou com uma taça de vidro gigante, na qual vinha uma quantidade quase industrial de gelado, gelado de café, como sempre, gelado de café, o nosso sabor. Aquilo fez-me sentir mais em casa do que nos últimos dez anos dentro daquelas paredes a que chamava lar.
- Queres alimentar um batalhão de fuzileiros, Nigel?
- Não, quero alimentar memórias que ficaram presas no tempo. Recordações que nos faz tão feliz. - a típica resposta do Nigel, sempre tão objectivo, sempre oportuno. Nestes anos todos, nem me apercebera como essa objectividade me fazia falta.
Sorri-lhe e começámos a comer o "álbum de recordações".
A música acabou e foi anunciado o intervalo. Desta vez o professor não veio ter comigo nem eu fui ter com ele, pode-se dizer que fiquei a descansar nas memórias.
O Nigel levantou-se e disse entre risos:
- Vejam só isto!
Foi-se embora e foi falar com os membros da banda que se encontravam no balcão a beber uma bebida qualquer, que me parecia tudo menos Coca-Cola ou leite com chocolate.
Em seguida dirigiu-se para o palco e com a sua amável voz falou para o público em geral.
- Agora pedia a vossa compreensão para o que se vai seguir. Eu falei com a banda e todos eles concordaram. Em vez de ser o Andy a cantar quem vai estar à vossa frente agora, vou ser eu, sim eu sei que vieram aqui para o ouvir a ele, mas é só uma música, prometo.

[Nigelucky]

Sabia que iria ser o presente perfeito para a Ava eu sei o quanto ela vai adorar esta prenda. Conhecia-a demasiado bem e ela a mim.
Subi para cima do palco o qual me fazia sentir único e como se fosse realmente importante para a felicidade de alguém.
- Pessoal, vou pedir-vos mais uma coisinha. Por favor não fiquem aí no balcão ou nas mesas feitos estátuas. Tomem mais um copo e levantem-se - reparei que as pessoas estavam a contribuir e a fazer o que eu realmente pedia, mas a Ava e a Emily, como eu previra mantinham-se na mesma imune ao meu pedido e às outras pessoas. Olhei para elas na esperança que me dessem ouvidos.
- Por favor, façam desta noite, uma noite épica, mais memorável do que aquela que tem vindo a ser até agora. - vi que Emily se levantou e estava a incentivar a Ava, embora ela se mantivesse intacta. - Vá lá.
Ava levantou-se e como se isso fosse sinal de partida dei à banda para fazerem o impossível.
Quando comecei a cantar I'm not Jesus dos Apocalyptica, fiquei contente por perceber que a minha voz não ficava muito abaixo de a de Corey Taylor que era o protagonista nesta música.
É impressionante a maneira e a rapidez com que uma música muda rapidamente o estado de espírito de uma pessoa principalmente se for misturada com um pequeno encantamento, mesmo só para ela se divertir um pouco mais.
Assim que a música começou a soar toda a sala começou a dançar, a mexer-se de forma insinuosa com movimentos sexy e tenho a certeza de que se alguém entrasse neste mesmo momento nesta sala pensaria que este bar era de alterne e não de um bar normal onde pessoas normais bebem bebidas normais ouvem música normal dançam normalmente e que se tornam por uma noite não normais. Algumas raparigas pareciam gatas com o cio a roçar-se em tudo o que era gaijo. A Ava dançava, elegantemente com os seus pés de bailarina. O que seria que ela estava a ver? Aquele encantamento que tinha acabado de lançar fazia com que cada pessoa sentisse a música e visse o ambiente que quisesse. Era bonito como comigo as cores mudavam de nota para nota, e a atmosfera daquele local parecia ganhar uma textura delicada e suave, aromatizada com fragrâncias que pareciam ter sido concebidas pelos e para os próprios Deuses, tão mais leve e real que o céu que nos cobria no stress do dia-a-dia.
Olhei para Emily, que permanecia quieta, a sorrir deliciada com os resultados do meu pequeno feitiço, apesar de não se deixar encantar pelo mesmo. O seu olhar encontrou o meu e ela deu uma gargalhada, antes de encolher os ombros e começar também a dançar por sua própria vontade, fazendo movimentos ligeiros e discretos.
Cerrei os olhos, enquanto cantava pela última vez o refrão, e sentia a música a extinguir-se em meu redor. Apesar de não ver o que se passava, senti as mudanças em meu redor. Aquela electricidade que nos embriagava a todos diminuía gradualmente de intensidade, o perfume doce e calmante deu lugar ao cheiro levemente alcoólico característico do local e a força da realidade esmagou-nos de imediato mal a última palavra da música se escapou por entre os meus lábios.
Respirei fundo, agradeci, e abandonei o palco.


Capítulo escrito por retarded. A BloodyDarpside apenas o publicou.