Love, Drugs & Rock n' Roll - Capítulo IX

[Michael MacMillan]
Os sons dos meus passos acelerados ecoavam nos corredores semi-vazios da minha escola, revelando a raiva que sentia.
Já era sexta-feira. No dia anterior, Thomas nem sequer tinha posto os pés na escola e tinha ignorado por completo os meus telefonemas. E era isso que me irritava. Saber que o gajo a que, sabe-se lá como, eu ainda chamava melhor amigo se andava a meter na merda e que me mandava ir dar uma volta quando o tentava acordar para a vida.
E agora, minutos após o toque de entrada para a nossa aula de Biologia, nem sinal dele, nem dentro da sala de aula, nem nos corredores. Ou ele estava a tentar chumbar por faltas, ou então preferia ficar fechado em casa, no seu quarto desarrumado e escuro, perdido no seu mundo de completa decadência.
- Michael?
Girei sobre os calcanhares, reconhecendo a voz de Amy. Ela estava a ofegar e o seu cabelo comprido e negro estava num desalinho pouco usual, e soube por isso que devia ter corrido até ali.
- Estamos atrasados. O que fazes fora da sala? - perguntou-me.
- Estou a ver se o parolo do Thomas aparece. - respondi, tentando controlar o tom de voz perante ela.
- Oh. - murmurou ela, franzindo a testa. - Claro. Eu aviso a professora, então.
Começou a andar em direcção à sala, porém eu fi-la parar com uma mão no seu ombro. Ela virou-se e o seu olhar penetrou o meu. Infiltrou-se na minha mente e espalhou-se dentro de mim como uma virose. Por momentos, não consegui pensar em mais nada senão nela, e naqueles olhos verdes. Tudo o que pensara na primeira vez que a vira, retornou para mim, desta vez com mais intensidade. A minha respiração estava descompassada, e a mão que estava sobre o seu ombro começou a tremer. A minha garganta ficou seca e o meu coração chocava contra o meu peito violentamente.
Não sabia o que estava a acontecer. O que quer que fosse, nunca antes me tinha acontecido.
O segundo toque despertou-me do pequeno transe em que entrara e apressei-me a pôr ambas as mãos nos bolsos e a olhar para os meus sapatos.
- Eu vou contigo. - disse, feliz por não estar a gaguejar. Respirei fundo, fazendo com que a minha respiração retomasse um ritmo normal. Vi-a pelo canto do olho assentir com a cabeça, antes de acelerar o passo. Segui-a em silêncio, pensando no que tinha acabado de acontecer.
Precisava mesmo de falar com Mia... Ou Thomas, se ele não estivesse pedrado, bêbedo, em coma ou mesmo num caixão da próxima vez que o visse.

[Thomas Sidhe]
Acordei com o som do portão da frente da Mansão Sidhe a fechar-se com violência. Gemi e olhei para o relógio. Sorri ao verificar que já tinha perdido a aula de Biologia. Está certo que era a aula em que mais perto eu estava da boazona da Amy e que a professora também se comia bastante bem, mas ainda assim a matéria fazia com que esta última deixasse de ser uma musa e passasse a parecer e a soar como uma hidra de sete cabeças.
E além do mais, assim o Michael provavelmente esquecer-se-ia do seu raspanete habitual. Sabia que já o estava a preparar desde quarta-feira, pelo que devia já estar mais que elaborado. Bah. Por muito boa companhia que fosse para sair, ele às vezes comportava-se tal como um dos ricaços do colégio - já o apanhara bêbedo umas três ou quatro vezes, mas para além disso, era um menino da mamã. Quando se lhe falava de drogas ou sequer tabaco, ele recusava e começava com os seus discursos cheios de moral sobre a dependência. Quem era ele para falar da dependência se ele nem nunca tocara em nada, nem sequer numa ganza? Eu já consumia há mais de um ano, e não estava agarrado; podia muito bem parar quando quisesse e sabia bem cuidar de mim.
Além do mais, a histórias que todos contavam sobre casos de toxicodependentes, para mim, não passavam de mitos. A minha pele não estava a ficar amarela, a minha resistência física continuava óptima, o meu cabelo não me estava a cair e estava sempre lúcido. Bem, quase sempre. Mas para que serve comprar LSD ou outra substância alucinogénia se não queremos mesmo flipar um pouco e sair do nosso mundo? Era como comprar bilhetes para ir ver um filme de terror em 3D e não querer pelo menos ter um ligeiro sobressalto.
Levantei-me e, coçando as costas, dirigi-me à casa-de-banho. Abri o armário dos compridos e, de dentro de uma caixa de xarope que se encontrava vazia, retirei o saquinho de plástico onde estava uns quantos gramas de cocaína. Com o tempo, ia encontrando esconderijos e estratagemas para manter a minha vida pessoal (e com isto, quero dizer a minha relação com as drogas), afastado dos olhares de terceiros e, especialmente, da minha mãe. Ela nunca se lembraria de ir procurar nada no meu armário de medicamentos, na minha casa de banho, que estava anexada ao meu quarto.
Peguei no saco transparente, olhei-me por momentos ao espelho, e fui à cozinha. O facto de se ter uma mansão nem sempre era agradável. Por exemplo, enquanto que Mia no minúsculo cubículo a que ela chamava casa deveria demorar apenas 5 segundos a ir da cozinha ao seu quarto, eu chegava a demorar dois ou três minutos a chegar ao meu destino.
Cheguei lá, ainda de boxers, e dirigi-me a um dos armários, onde a minha empregada guardava os pacotinhos de açúcar para o chá de camomila da minha querida mamã. Os tais esconderijos e estratagemas para manter a droga escondida das outras pessoas? Os pacotes de açúcar são um deles.
Abri um pacote de açúcar com cuidado para não o rasgar - limitei-me a descolar as partezinhas da parte superior. Despejei o conteúdo para o caixote do lixo e dei uma olhadela ao relógio da parede. A empregada só chegava dentro de duas horas, pelo que estava descansado.
Abri a gaveta dos talheres e tirei uma colher de café, pousando-a em seguida entre o saco de plástico com o pó branco e o pacote de açúcar agora vazio. Abri o saco e enfiei a colher, enchendo-a ao máximo. Com a outra mão, abri o pacote e, meticulosamente, transferi o conteúdo da colher para lá. Fiz o mesmo novamente.
Fechei o saco de plástico, ainda com bastante cocaína. Olhei para a colher, ainda com resíduos, e para o balcão, que ficara com vestígios da minha operação. Lambi a colher e snifei o que estava no balcão - para quê desperdiçar?
Pus a colher na máquina de lavar, peguei no saco da coca e no pacote que outrora tinha ostentado açúcar, e regressei à minha casa-de-banho. Guardei o saco novamente no seu esconderijo.
Olhei para o pacote e sorri satisfeito. Bastava-me selar o pacote com um pouco de cola e já estava - um pacote com droga que passava perfeitamente por um pacote de açúcar. Era prático e discreto... Melhor que os comprimidos que o Z me tinha tentado vender.

[Michael MacMillan]
Os corredores estavam atolados de gente quando a professora nos deu autorização para sair da aula e desfrutar o intervalo. O barulho ensurdecedor e o facto de eu não dever muito à altura faziam com que a tarefa de encontrar Mia sem me afastar de Amy fosse debilitada. Tinha desistido de gritar por ela quando me apercebi que nem mesmo eu me conseguia ouvir  - o que era ridículo.
Quando choquei contra Mia, também ela parecendo estranhamente confusa e perdida no meio de tudo, não hesitei em agarrar-lhe a mão. Ela apertou a minha e, após eu dar uma olhadela e verificar que Amy não se tinha perdido e que continuava a seguir-me, fomos para o pátio.
- O que se passa lá dentro? - perguntei.
Mia encolheu os ombros, mas respondeu.
- Os miúdos de uma escola pública vieram ver algo no auditório, muito provavelmente. Eu pelo menos vinha cá muitas vezes por causa disso.
Assenti com a cabeça, enquanto colocava as mãos nos bolsos. Parecia-me provável.
- Como te correu a aula de geometria?
Mia começou a responder, mas não lhe prestei atenção. O meu olhar deslizou automaticamente para Thomas, que entrava naquele momento na escola, com o seu típico sorriso convencido no rosto. Acenou para um de nós, mas não percebi a quem se dirigia, visto que os seus óculos de sol da Prada eram demasiado opacos para que eu pudesse perceber para quem estava a olhar. Excluí de imediato Mia - eles odiavam-se profundamente.
Quando ele se aproximou de nós, as palavras deslizaram para fora da minha boca antes que eu pudesse ordenar aos meus lábios que se mantivessem selados.
- E então? Achas bem isto? - perguntei, com raiva na voz. - Faltaste à última aula de quarta e às aulas de ontem por causa da porcaria da droga!
Ele riu-se categoricamente e tirou os óculos de sol, para que me pudesse encarar. Fiquei feliz quando reparei que os seus olhos aparentavam estar normais, sem qualquer sinal aparente de consumo de substâncias ilícitas.
- Na verdade, Michael - disse ele num tom sereno e calmo. -, eu faltei às aulas porque fui arranjar ajuda. Decidi recorrer a um psicólogo para deixar este vício há já algum tempo. Percebi finalmente o que dizias com o facto de eu estar a arruinar a minha vida. Ontem tive a minha primeira sessão. A minha mãe não sabe de nada, mas um bom suborno fez com que o psicólogo decidisse manter a confidencialidade.
Olhei para ele espantado. Mia tinha um ar semelhante ao meu.
Por momentos, julguei que o que ele dissera não passava de uma mentira. Porém, se ele estivesse a mentir, porque raio diria que a mãe dele de nada sabia? Era bem provável que fosse verdade - o Thomas jamais seria capaz de admitir perante os pais a porcaria que tinha andado a fazer.

[Thomas Sidhe]
Ah, como uma mentirinha nos pode safar de boa.

[Michael MacMillan]
- Acredita em mim. - disse ele, sorrindo com o que me parecia ser sinceridade. Passou o ombro por cima de Mia que desviou o olhar para os pés. - Pergunta à Mia. Sou um homem diferente. Até me estou a dar melhor com ela e tudo.
E, chocando-me mais que a própria afirmação, Thomas beijou Mia. Um beijo profundo. Um beijo que, estranhamente, foi correspondido pela rapariga de cabelos castanhos e olhos azuis.
Sorri-lhes cinicamente, ainda que nenhum dos dois me estivesse a observar e afastei-me rapidamente.
Só ao fim de uns metros é que percebi que Amy me tinha seguido. Ela pousou a sua mão no meu ombro, fazendo-me parar. Parecia preocupada comigo.
- Passa-se alguma coisa? - perguntou, numa voz suave com um ligeiro sorriso.
Suspirei.
- Sim. - respondi, tentando controlar a raiva. - Tu acreditas no que acabaste de ver? Eles ainda há dois dias atrás se odiavam!
- É. Também estranhei.
- Não me entendas mal. - acrescentei rapidamente. - A questão é que...  A Mia para mim é como se fosse uma irmã, percebes? E, se tu perguntares à Jane ela dir-te-á o mesmo, eu sou o tipo de irmão mais velho super-protector e ciumento. É claro que me custa vê-la com o Thomas. O tipo às vezes consegue ser decente, e acredito que esteja a tentar mudar mas... Eu conheço-o. Sei bem o traste que aquele gajo esconde por detrás da sua faceta de amigo. Sei todas as histórias das suas conquistas e ainda conheço melhor as histórias de como ele partiu o coração às mesmas. Não quero que ela sofra.
- Não te preocupes, Michael. - disse ela, aumentado a dimensão do seu sorriso. Agarrou-me a mão e não pude deixar de notar no quão macia era a sua pele, e na sensação de conforto que o seu toque frio me trouxe por momentos. - A Mia não se vai magoar, ela tem juízo. Por exemplo, aquele beijo? Ela não o queria. Percebi pela maneira como ela franziu as sobrancelhas, como se estivesse enojada. Creio que ela não o afastou apenas para não parecer indelicada.
Fiquei a olhar para Amy, respirei fundo e sorri-lhe de volta também, mais confortável. Ver Thomas com a minha melhor amiga fizera-me sentir... mal, completamente mal. Nunca na vida sentira tanta raiva por Thomas como naquele momento.
- Sim, realmente parece algo dela. - anui.
- Sabes que... Quando vos vi juntos pela primeira vez... Julguei que vocês eram namorados.
Soltei uma gargalhada, e abanei a cabeça.
- Todos pensam. Mas somos só bons amigos. - refutei, sem levar a mal.
- Hum... E tencionas apresentar-me a tua namorada? - perguntou ela, mordendo o lábio.
Sorri-lhe embaraçado, olhando por uma fracção de segundo para as nossas mãos dadas. Não sei se ela reparou ou não, mas de qualquer dos modos, não me largou.
- Não tenho. - retorqui. Ela fez um ar de espanto e eu abafei uma gargalhada. - Qual é o espanto?
- Bem... - disse ela, lentamente. - Não me vais dizer que nunca antes reparaste que é giro.
Ri-me. Acabei por ser eu a arrancar a minha mão das dela, com os movimentos todos que fazia ao dar gargalhadas.
- Então é por isso que olhaste para mim fixamente no primeiro dia de aulas. - mostrei-lhe a língua e pisquei-lhe o olho no gozo.
Ela deu-me uma estalada no ombro, sem força, enquanto se ria e fingia estar espantada.
- Estúpido! - disse ela, entre gargalhadas.
- Parva. - retorqui, dando-lhe um encontrão gentilmente. Antes que ela entendesse mal, acrescentei - Não levas a mal que te chames nomes, certo? É só uma brincadeira.
Ela sorriu.
- Eu sei, e estou na boa com isso.
Sorri-lhe de volta, feliz por ter quebrado um pouco do gelo que havia entre nós. Não que nos déssemos mal, mas uma semana não era muito tempo para se criar uma amizade.
- E então... Há algum rapaz para os teus lados? - atrevi-me a perguntar.
- Sim. - ela suspirou. O seu sorriso desfez-se um pouco e ela olhou para os seus pés. - Tenho um namorado. Mora em Heartcreek, a cidade onde morava. Ele quis tentar um relacionamento à distância, mas eu não acredito muito no nosso futuro. Isto é, acredito em relacionamentos à distância, e de Heartcreek a Lillegard são apenas duas horas de distância, mas... A nossa relação andava um pouco tremida quando me mudei. Ele andava com más companhias, ignorava-me e estava a mudar. Enfim... Pode ser que isto até nos faça bem.
Assenti com a cabeça, sem saber ao certo o que lhe dizer. Senti-me abalado, ainda que não percebesse porquê. Enfim, teria tempo para descobrir o que se passava comigo mais tarde.

[Ava Prescott]

O "Carter's Way" era um barzinho que passava despercebido, na zona histórica da cidade. De facto, nunca ninguém lá entrava porque o bar, no exterior, nada mais tinha que uma porta escura, velha, com um ar decrépito escondida no meio de outras portas que davam passagens para residências já um tanto quanto antigas e um conjunto de luzes néon de pequena dimensão que tremiam freneticamente formando o nome do bar, no qual já faltava ambos os "R" e o "Y". De facto, no exterior, o local tinha um ar repulsivo e, caso por lá passasse, jamais me lembraria de entrar naquele local.
Mas ainda bem que o professor me tinha convidado para o concerto pois poder-se-ia muito bem aplicar àquele local o provérbio "Não se julga um livro pela capa". No interior, o bar era bastante grande e agradável.
Haviam umas vinte mesas de diversos tamanhos espalhadas pelo local, todas estas cobertas com uma toalha de mesa com um padrão axadrezado preto e branco que me fizeram repentinamente lembrar os maravilhosos anos 50. O chão tinha o mesmo padrão, porém com quadrados maiores, e estava impecavelmente limpo. As cadeiras eram todas vermelhas, com um ar bastante confortável, e que combinavam na perfeição com os bancos altos que estavam juntos ao balcão de mármore negro, onde um rapaz de cabelo ruivo bastante atraente se entretia a conversar com os clientes e a servir bebidas, com um belo sorriso nos lábios. Para completar o estilo dos anos 50, várias imagens do Elvis Presley e da Marylin Monroe, bem como de outras estrelas que eu não conseguia identificar, estavam espalhadas pelas paredes brancas e, como não podia deixar de ser, uma jukebox encontrava-se encostada a uma das paredes.
No fundo, havia um palco que se encontrava uns noventa centímetros acima do chão que eu pisava naquele momento, onde jaziam instrumentos musicais e onde, pensei com uma felicidade histérica, estaria o professor Sid momentos mais tarde.
O bar todo estava infestado com um cheiro que me fazia sentir como se estivesse no meio de uma floresta, rodeada por todos os odores magníficos da Natureza. Só o ambiente, fez-me crer de que voltaria lá muitas vezes. Talvez com Mia.
Sentei-me numa das mesas mais pequenas e, como se tivesse adivinhado, mal o fiz, vi a banda entrar para o palco. Sorri quando vislumbrei o professor Hawthorne. Claro, nem parecia um professor. A sua camisa tinha sido substituída por uma t-shirt dos Motorhead e as suas calças de ganga clara por umas calças negras, justas.
Um homem com braços incrivelmente musculados tomou o seu lugar atrás de uma bateria negra, e piscou o olho à única mulher presente. A mulher de cabelos negros e madeixas brancas piscou-lhe o olho de volta, enquanto pegava numa guitarra eléctrica vermelha e  ligava ao amplificador, mordiscando o lábio pintado de um vermelho escuro adornado com um piercing. Um homem com uma crista vermelha, mais alto que o resto da banda e que vestia umas calças rasgadas e cheias de correntes, deu um beijo ao seu baixo negro, antes de colocar a fita por cima dos seus ombros. E o Sid... Ficou atrás do microfone, espantando-me.
No preciso momento em que eu arqueara as sobrancelhas e o meu queixo caíra, o professor Hawthorne olhou para mim. Fechei de imediato a boca, embaraçada pelo facto de aquele homem me ter visto com uma carantonha daquelas, o que fez com que o mesmo desse uma gargalhada, tapando o microfone, para que não fosse amplificada.
Senti-me a corar, mas fiquei feliz por notar que ninguém estava a olhar para mim. Menos mal.
- Boa noite. - disse Sid. A sua voz amplificada fez com que eu me arrepiasse. - Nós somos os Surprised By Death, como a maioria de vós sabe. Queria agradecer todos aqueles que nos vieram ver, em especial àqueles que aqui estão pela primeira vez. Sabem o que se costuma dizer - a primeira vez é sempre mágica, certo?
Sorri quando ele olhou para mim. Ele manteve o olhar preso em mim, enquanto continuava a falar.
- Portanto, foi-nos pedido por um aniversariante que tocássemos a sua música preferida em primeiro lugar. Apesar de não ser propriamente o nosso estilo, decidimos aceitar esse pedido. E além disso, é melhor começarmos com uma música mais calma, pois sinto que pessoas aqui não estão preparadas para as músicas do nosso nível. Relembro-vos, não estamos aqui para tocar música clássica.
Ele sorriu de modo desafiante para mim, e eu respondi-lhe de mesmo modo, aceitando o desafio. Olhei para o lado e corei, ao perceber que o rapaz do bar estava a olhar para mim... E lá estava eu, a sorrir feita parva para um vocalista de quase 30 anos.
Comecei por ouvir a guitarra, e reconheci logo a música. A "Dirty Little Secret" ressoou por todo o bar, fazendo com que toda a gente cantasse. Confesso que até eu comecei a cantarolar, até me recordar que a minha voz para pouco mais servia do que espantar pássaros.
A voz de Sid era mais grave e profunda que a do vocalista dos All American Rejects, mas nem por isso a música soou mal. De facto, soou bastante bem. Nunca esperar ouvir uma versão assim daquela música, muito menos cantada por um professor. Por um professor de História da Arte!
A música acabou, e todos bateram palmas. Eu também, histericamente. Não consegui conter o meu histerismo, e cheguei mesmo a soltar uns quantos guinchos. O professor Hawthorne reparou nisso e sorriu-me. Puxa, ele tinha um sorriso lindo.
- Muito bem, - disse ele novamente. - assim vemos que não é precisa muita gente para fazer muito barulho. Obrigada a todos, nós vamos só fazer um pequeno intervalo porque o baixo está um pouco desafinado, mas voltamos já. Até lá, bebam umas cervejolas, sim?
Ele sorriu e abandonou o palco, tal como a guitarrista e o baterista. O baixista ficou realmente lá, a mexer no seu instrumento.
Olhei para cima da minha mesa, onde jazia o meu telemóvel. A minha mãe não me dissera nada, nem tampouco a minha professora de ballet. Estava de certo modo aliviada. Se me obrigassem a sair dali, ficaria bastante desiludida. Claro que eu estava sozinha, mas estava divertida.
- Então sempre vieste.
Sobressaltei-me ao ouvir a voz do professor Hawthorne. Ele sentou-se à minha frente, ignorando o saltinho que dei na cadeira. Reparei que os seus olhos estavam rodeados de eyeliner negro, dando aos seus olhos um ar mais profundo.
- Claro, stôr. Acha que perdia uma oportunidade destas? - perguntei.
Ele ergueu ambas as mãos, como quem diz "Alto e pára o baile!".
- Sou apenas professor na escola. - retorquiu. - Fora da escola, sou teu amigo, por isso podes chamar-me Sid. No "Carter's Way", eu sou vocalista, por isso podes chamar-me Andy.
Arqueei ambas as sobrancelhas.
- Andy? - perguntei.
- Sim, é o meu nome de estrela. O meu pseudónimo. Andy Cap.
Não pude evitar rir-me. Ele piscou o olho e sorriu.
- Para além de história da arte, percebes também inglês. Enfim... O que achaste?
Sorri-lhe, desafiante.
- Na verdade, - respondi eu. - acho os The All American Rejects demasiado pop-rock para mim.
Ele sorriu, com uma expressão semelhante à minha.
- Temos de tratar disso, então, não é? - perguntou ele. Anui e ele deu uma gargalhada.
- Hey, Andy, podes parar de namorar e vir para o palco?
Tanto eu como Sid nos assustámos quando ouvimos a voz da guitarrista, que se tinha aproximado sem que desse conta. A guitarrista olhou para mim com os olhos cheios de desprezo, mas eu controlei-me para não lhe dar troco.
- Claro. - disse Sid. - Oh... Melissa, esta é a Ava. Ava, esta é a Melissa, a guitarrista. Porém, às vezes trocamos e sou quem toco guitarra e ela quem canta.
Assenti com a cabeça. Melissa limitou-se a revirar os olhos. Agarrou no pulso de Sid e puxou-o. Ele olhou para mim e encolheu os ombros, como que a pedir desculpa pelo comportamento da guitarrista e eu encolhi os ombros também.
Falaria com ele no fim do concerto... Se a minha mãe ou a minha professora de Ballet não me dissessem nada.

1 facetas:

Anónimo disse...

gosto muitooo *.*